Devidamente
refeito, o Sobrinho de Enesidemo volta para pagar dívidas e cumprir sua
promessa de seguir as vicissitudes da leitura do Manifesto Comunista.
Desde o início, meu folhetim A Claraboia e o Holofote insiste
nessa questão: por que o Manifesto continua a ser um documento
fundamental e definidor da modernidade apesar do desastre histórico do
comunismo? Ou, o que dá no mesmo, por que o comunismo é declarado extinto e obsoleto e, ao mesmo tempo, continua a ser temido e esconjurado como o pior dos demônios?
Ao
longo da estrada que estamos percorrendo, aquela que conduz da Comuna de 71 ao
Soviet de 17, o Manifesto foi, para os militantes marxistas, a claraboia que iluminava o presente e o holofote que lançava luz sobre
o futuro. Assim o consideravam Lenin e Rosa Luxemburg.
Esse tempo passou, mas, mesmo hoje, parece haver muita brasa dormida sob a
cinza do velho documento, razão pela qual ele ainda integra a versão gauche da
coleção “Tesouros da Juventude”.
Tentar
entender a glória problemática do Manifesto Comunista não é apenas
um exercício de curiosidade malsã. Ocupado com a tarefa de ganhar o pão, o
Sobrinho de Enesidemo tem raros momentos de ócio e não pode perdê-los com as
frivolidades contemporâneas (repito as palavras de Nietzsche já citadas em
outra ocasião: um filósofo precisa de descanso sobretudo de uma coisa: do
hoje). Refazer o caminho percorrido pela militância marxista do passado me
parece parte essencial da tarefa de compreender a desorientação da esquerda de
hoje, dividida entre a repetição das bravatas do velho marxismo, que vive do anúncio do colapso próximo do capitalismo, e a rendição, travestida de postura
inteligente, daqueles que batem à porta de Hannah Arendt para mendigar alguns
conceitos.
É
por isso que o Sobrinho de Enesidemo retorna à cena original do socialismo
revolucionário. Quando estivemos com Lenin pela última vez (A Claraboia e oHolofote #28 XI), Vladimir Ilitch tinha anunciado suas Teses de
Abril. O ano de 1917 foi longo e devemos avançar agora até a
crise do mês de julho, quando, mais uma vez exilado, Lenin se ocupou de redigir O
Estado e a Revolução.
Pelo bem ou pelo mal, A Claraboia e o Holofote está de volta.