domingo, 13 de março de 2016

A claraboia e o holofote #30 (I)










Uma leitura do Manifesto do Partido Comunista



Lenin


1917: de abril a julho


Por muito tempo, Lenin sustentou que uma revolução burguesa na Rússia deveria esgotar suas possibilidades democráticas antes que o proletariado estivesse em condições de tomar o poder. Essa teoria das duas etapas do processo revolucionário se tornara o senso-comum para os bolchevique. No entanto, nos dois últimos anos de seu exílio, a visão de Lenin se transformara radicalmente. A leitura da Ciência da Lógica de Hegel e, principalmente, a análise do capitalismo monopolista de Estado, que deflagara a guerra imperialista entre as potências europeias, permitiram que Lenin superasse o choque e a desorientação sentidos em agosto de 14, quando a bancada do SPD no Reichstag aprovou a concessão de créditos de guerra ao Kaiser.

Antes de desembarcar na Estação Finlândia no 3 de abril, Lenin já anunciara nas Cartas de Longe a necessidade de rever as posições bolcheviques. Mesmo assim, ao chegar a Petrogrado, a sua exposição das Tarefas do proletariado na presente revolução (as Teses de Abril) chocou, no limite do ultraje, os social-democratas russos – mencheviques e bolcheviques - reunidos no Palácio Táuride.

O que Lenin propunha na primavera de 17 era bastante simples. Desde a revolução de fevereiro havia na Rússia uma dualidade de poderes: de um lado estava o governo provisório, dominado por oligarcas e burgueses; do outro lado, o governo frágil e embrionário dos sovietes de operários e soldados. Segundo Lenin, os bolcheviques deveriam negar qualquer apoio ao governo provisório, o qual, a despeito das promessas democráticas, representava a manutenção da guerra e dos interesses imperialistas. A nova palavra de ordem deveria ser “Todo o poder aos Sovietes”: ao invés das estruturas parlamentares da democracia burguesa, era preciso instaurar uma república soviética dos operários e camponeses. Urgia, portanto, avançar imediatamente para a nova etapa da luta revolucionária. 

Os bolcheviques deveriam reconhecer que a sua relutância em participar dos sovietes (dominados por militantes mencheviques ou socialistas-revolucionários) constituía uma das fraquezas do partido. Somente pela ação dos sovietes seria possível alcançar um poder de novo tipo, semelhante ao da Comuna de Paris, em que o povo armado e organizado assumisse as funções de exército, de polícia e de funcionários do governo. Os meios de produção seriam primeiramente nacionalizados e controlados pelo Soviete dos Deputados dos Trabalhadores até que fosse possível passar à socialização efetiva dos meios de produção.

No final das Teses de Abril, Lenin propunha que o partido bolchevique deveria marcar sua ruptura definitiva com a social-democracia adotando o nome de Partido Comunista, e que uma Internacional revolucionária deveria ser organizada em oposição à Segunda Internacional, corroída pelo chauvinismo e pelo oportunismo.

Os bolcheviques receberam essas propostas com espanto, desconfiança e hostilidade. Lenin teve ásperas discussões com o comitê central do partido, que o acusava de aproximar-se da heresia trotskista, mas conseguiu vencer essas resistências internas e ainda obter a inflamada colaboração do antigo adversário Leon Trotski.

Entre abril e junho, a situação social e econômica se deterioraou rapidamente. A crise de abastecimento, a continuidade da guerra e as dissensões internas do governo provisório (do qual participavam conservadores, liberais e social-democratas moderados) causavam descontentamento popular e aumentavam o risco de um golpe de Estado. As jornadas de abril e de julho polarizaram a arena política entre as forças revolucionárias e as contrarrevolucionárias, eliminando as possibilidades de negociação e de conciliação.

Em meados de junho, o governo provisório ordenou uma ofensiva contra o exército alemão, que resultou num desastre humilhante para os russos. As notícias chegaram a Petrogrado no começo de julho. Os soldados que regressavam do front e os marinheiros revoltosos do Kronstadt saíram às ruas pedindo “todo poder aos sovietes”. Os militantes anarquistas estavam prontos para agir, mas o comitê central dos bolcheviques hesitou sem a presença de Lenin, que passava alguns dias de repouso no campo. O governo provisório encabeçado por Kerenski fechou os jornais bolcheviques e decretou a prisão de seus líderes. Na clandestinidade, Lenin fugiu para a Finlândia e começou a redigir O Estado e a Revolução naqueles meses em que o golpismo contrarrevolucionário ameaçava triunfar na Rússia. 






Ein Marxist hat nicht das Recht, Pessimist zu sein.  




вся власть Советам!