domingo, 22 de fevereiro de 2015

A claraboia e o holofote #28 (VIII) Apêndice









Uma leitura do Manifesto do Partido Comunista



Alguns materiais a serem considerados



O ensaio Imperialismo, fase superior do capitalismo, que abordamos no capítulo anterior, é mais do que controverso. É um terreno onde paixões politicas se digladiam. A antologia que se segue pretende apenas oferecer alguns excertos das obras em que se assentam os pressupostos teóricos do famoso ensaio de Lenin.




1. Sobre o conceito de imperialismo no começo do século XX


“Não somente os marxistas, mas também os teóricos da economia capitalista liberal clássica predominantemente tinham a opinião de que as possibilidades de crescimento do moderno sistema capitalista não eram ilimitadas e que, portanto, era importante, se não essencial, estender este sistema a territórios virgens, ou, como diriam hoje, às áreas subdesenvolvidas do mundo. Considerações deste tipo já podiam ser encontradas na Filosofia do Direito, de Hegel. Por essa razão é que encontramos quase como um componente constante do pensamento burguês antes de 1914 a ideia de que a economia capitalista necessitava de mercados ultramarinos e oportunidades de investimento e que seria necessário obtê-los por meios imperialistas. A velha teoria liberal era de que o avanço da civilização, comércio e indústria por todo o globo era uma atividade missionária e que não requeria o estabelecimento de nenhuma soberania formal, salvo em casos excepcionais. Por isso muitos daqueles que acreditavam numa ordem econômica baseada no comércio mundial e no crescimento das exportações se opuseram por muito tempo ao imperialismo no sentido mais estrito. Eles argumentavam que, enquanto as políticas imperialistas capacitavam certas empresas a assegurar lucros monopolísticos às custas da comunidade, elas também distorciam o processo de crescimento econômico de uma maneira que estava destinada a ter consequências danosas. Foi somente depois de que um certo número de estados industriais gradualmente adotarem uma polícia de tarifas protecionistas - Alemanha em 1879, France (em algumas de suas colônias) nos anos de 1890 e os Estados Unidos na virada do século - é que os círculos liberais começaram a ter uma visão mais favorável, em termos econômicos, da aquisição de territórios d'além-mar pelos seus respectivos países. (...) De maneira geral, havia muita hesitação no campo burguês quanto a decidir se o imperialismo formal era desejável ou se a expansão econômica informal era suficiente, mas havia o consenso relativamente firme de que um dos principais objetivos do moderno imperialismo era fornecer às economias nacionais novas fontes de matérias-primas, mercados e áreas de investimentos além-mar. Essas tendências estavam relacionadas ao fato de que de 1973 em diante o ritmo da economia internacional começou a tornar-se mais lento: houve uma queda geral dos preços e uma considerável diminuição dos lucros A convicção de que a economia nacional precisava de territórios coloniais dependentes logo se tornou geralmente aceita pela classe burguesa de todas as nações industriais, e isso não aconteceu apenas por causa da pressão exercida pelos grupos empresariais diretamente envolvidos.”

(Wolfgang J. Mommsen, Theories of Imperialism, pp. 9-10)



2. Sobre a teoria do imperialismo de Hobson

Em 1902, num momento em que a imprensa e a opinião pública britânicas discutiam a 2ª Guerra dos Bôeres, o economista social-liberal John Atkinson Hobson publicou sua análise pioneira do imperialismo, um fenômeno novo que passara a fazer parte da agenda política das nações mais industrializadas, a começar pela Grã-Bretanha, a partir dos anos 70 do século XIX.

“Embora, por conveniência, o ano de 1870 tenha sido considerado o indicador do começo de uma política consciente de imperialismo, ficará evidente que o movimento não atingiu sua plena força até a metade dos anos 80. O vasto aumento de território e o método de divisão por atacado que nos cedeu grandes faixas de terras africanas pode ser datado de 1884. Em quinze anos, cerca de 3.750.000 milhas quadradas foram acrescidas ao Império Britânico.
No entanto, a Grã-Bretanha não estava sozinha nesta empreitada. Uma das características principais do imperialismo moderno, a competição entre impérios rivais, é produto deste mesmo período. O fim da Guerra Franco-Prussiana marca o começo de uma nova política colonial para a França e a Alemanha, destina a ter efeito na década seguinte.”

(J. A. Hobson, Imperialism: a study, pp. 19-20)

Na introdução de seu trabalho, Hobson expunha como o movimento das nacionalidades no século XIX abria a esperança de um internacionalismo pacífico:

“O velho nacionalismo era primeiramente um sentimento de inclusão; seu correspondente natural em termos de sentimento quanto aos outros povos era a falta de simpatia, não a hostilidade aberta; não havia um antagonismo inerente que impedisse as nacionalidades de crescerem e prosperarem lado a lado.” (idem, p. 10)

Não haveria, portanto, oposição entre o nacionalismo (tal como entendido no século XIX) e o internacionalismo:

“Um internacionalismo verdadeiramente forte na forma e no espírito implicaria a existência de nacionalidades fortes e orgulhosas que procuram união na base de interesses e necessidades nacionais comuns.  Tal desenvolvimento histórico seria muito mais conforme às leis do progresso social do que o surgimento de um cosmopolitismo anárquico a partir de unidades individuais em meio à decadência da vida nacional.” (idem, p. 9)

No entanto, se o nacionalismo e o internacionalismo se tornaram divergentes era por causa da forma pervertida que o nacionalismo assumiu:

“O imperialismo agressivo não somente derrota o movimento em direção ao internacionalismo ao promover as animosidades entre os impérios competidores; ele ataca também as liberdades e a existência das raças mais fracas ou inferiores estimulando nelas como contrapartida um excesso de autoconsciência nacional.” (idem, p.9)

“A disputa pela África e pela Ásia remodelou quase toda a política das nações europeias, provocou alianças que ultrapassavam todas as linhas naturais de simpatia e de ligação histórica, conduziu cada nação continental a consumir uma parcela sempre crescente de seus recursos humanos e materiais em equipamento militar e naval, arrastou a grande e jovem potência dos Estados Unidos do seu isolamento para o auge da competição; e, pela multiplicidade, magnitude e surpresa das questões que ele lançou na cena política, tornou-se um agente constante de ameaça e de perturbação da paz e do progresso da humanidade. A nova política tem exercido uma influência formidável e notável sobre o modo de governar assumido pelas nações que a incentivam. Enquanto produz para consumo popular doutrinas sobre destino da nação e a missão imperial civilizadora, contraditórias em seu significado, mas complementares uma às outras em seu papel de apoio ao imperialismo popular, também desenvolve um tipo ganancioso e calculista de maquiavelismo, chamado ‘real politik’ na Alemanha, onde foi elaborado, o qual remodelou toda a arte da diplomacia e erigiu o engrandecimento nacional sem piedade ou escrúpulos como motivo consciente da política externa”.  (idem, p 11)

“Enquanto as nacionalidades co-existentes são capazes de ajuda mútua, sem o envolvimento de qualquer antagonismo de interesses, os impérios co-existentes, ao seguirem cada qual a sua trajetória imperial de engrandecimento territorial e industrial, são naturalmente inimigos. A natureza completa deste antagonismo em seu aspecto econômico não pode ser entendida sem uma análise minuciosa das condições da moderna produção capitalista que leva a uma ‘luta pelos mercados’ cada vez mais aguda, mas o antagonismo político é óbvio." (idem, p. 10)

A análise da relação íntima entre produção capitalista e os antagonismos imperialistas requer resposta à questão: por que uma nação embarcaria numa uma política tão custosa e desastrosa como a imperialista? Isso é o que Hobson responde no capítulo IV, “Os parasitas econômicos do imperialismo”:

 “De longe, o fator econômico mais importante no Imperialismo é a influência ligada aos investimentos. O crescente cosmopolitismo do capital é a grande mudança econômica dessa geração. Cada nação industrial avançada tende a colocar uma parcela maior de seu capital fora dos limites de sua própria área política, em países estrangeiros, ou em colônias, e a extrair um rendimento crescente dessa fonte” (idem, p. 56)

“O imperialismo agressivo, que custa tão caro aos contribuintes, que tem tão pouco valor para o manufatureiro e o comerciante, que é repleto de tão grave e incalculável perigo para os cidadãos, é fonte de grande ganho para o investidor que não pode encontrar em casa o uso lucrativo que ele procura para seu capital, e insiste que seu governo deve ajudá-lo com investimentos lucrativos e seguros no exterior.” (idem, p. 62)

“As finanças manipulam as forças patrióticas geradas pelos políticos, soldados, filantropos e negociantes; o entusiasmo pela expansão que vem dessas fontes, embora forte e genuíno, é irregular e cego; o interesse financeiro tem aquelas qualidades de concentração e cálculo clarividente que são necessárias para fazer funcionar o imperialismo.’ (idem, p. 66)

A raiz desses capitais ociosos que levavam a investimentos no exterior seria a fraqueza do mercado interno, devido aos baixos salários dos trabalhadores. A solução seria uma distribuição melhor da renda:

“Não há necessidade de abrir novos mercados no exterior; os mercados internos são capazes de expansão indefinida. O que quer que seja produzido na Inglaterra pode ser consumido na Inglaterra, desde que a ‘renda’, isto é, o poder de demandar mercadorias, seja devidamente distribuída. (...) Uma economia que concede às classes possidentes um excesso de poder de consumo que eles não têm capacidade de usar e não podem converter em capital realmente útil, é uma economia do tipo que não come nem deixa comer.” (idem, p. 95)

A ampliação da capacidade de consumo deveria ser feita às expensas do capital rentista e especulativo (precisamente aquele que se beneficiava do imperialismo), por meiro da distribuição de renda e aumento da massa salarial.



3. Fragmentos de O Capital Financeiro, de Hilferding

Capítulo 15 – Price determination by the capitalista monopolies and the historical tendency of finance capital

“Classical economics conceives price as the expression of the anarchic character of social production, and the price level as depending upon the social productivity of labour. But the objective law of price can operate only through competition. If monopolistic combinations abolish competition, they eliminate at the same time the only means through which an objective law of price can actually prevail. Price ceases to be an objectively determined magnitude and becomes an accounting exercise for those who decide what it shall be by fiat, a presupposition instead of a result, subjective rather than objective, something arbitrary and accidental rather than a necessity which is independent of the will and consciousness of the parties concerned. It seems that the monopolistic combine, while it confirms Marx's theory of concentration, at the same time tends to undermine his theory of value. Classical economics conceives price as the expression of the anarchic character of social production, and the price level as depending upon the social productivity of labour. But the objective law of price can operate only through competition. If monopolistic combinations abolish competition, they eliminate at the same time the only means through which an objective law of price can actually prevail. Price ceases to be an objectively determined magnitude and becomes an accounting exercise for those who decide what it shall be by fiat, a presupposition instead of a result, subjective rather than objective, something arbitrary and accidental rather than a necessity which is independent of the will and consciousness of the parties concerned. It seems that the monopolistic combine, while it confirms Marx's theory of concentration, at the same time tends to undermine his theory of value.

(…)

The immediate effect of cartelization is a change in the rate of profit for the cartels at the expense of other capitalist industries. These different rates of profit cannot be equalized by the transfer of capital, because cartelization means that the competition of capitals for spheres of investment is restricted. The limitation of the free movement of capital by various economic factors or property relations (such as a monopoly of raw materials) is indeed a precondition for the abolition of market competition among sellers. Equalization of the rate of profit can only take place by participation in the higher rate of profit through self cartelization, or through the elimination of cartels by vertical integration. Both methods involve a growth of concentration and thus facilitate further cartelization.

(…)

Cartelization brings exceptionally large extra profits, and we have seen how these extra profits are capitalized and then flow into the banks as concentrated sums of capital. But at the same time cartels tend to slow down capital investment; both in the cartelized industries, because the first concern of a cartel is to restrict production, and in the non-cartelized industries because the decline in the rate of profit discourages further capital investment. Consequently, while the volume of capital intended for accumulation increases rapidly, investment opportunities contract. This contradiction demands a solution, which it finds in the export of capital, though this is not in itself a consequence of cartelization. It is a phenomenon that is inseparable from capitalist development. But cartelization suddenly intensifies the contradiction and makes the export of capital an urgent matter.

(…)

The tendencies towards the establishment of a general cartel and towards the formation of a central bank are converging, and from their combination emerges the enormous concentrated power of finance capital, in which all the partial forms of capital are brought together into a totality. Finance capital has the appearance of money capital, and its form of development is indeed that of money which yields money (M - M') - the most general and inscrutable form of the movement of capital. As money capital it is made available to producers in two forms, as loan capital or as fictitious capital. The intermediaries in this process are the banks, which endeavour at the same time to convert an ever increasing part of this capital into their own capital, thus endowing finance capital with the form of bank capital. This bank capital becomes increasingly the mere form - the money form - of actually functioning capital, that is, industrial capital. At the same time as finance capital eliminates the division between bank capital and productive capital, commercial capital also increasingly loses its independence, and within industrial capital itself the progress of combination among previously separate and independent branches of production breaks down the barriers between different spheres. The social division of labour - the division into diverse spheres of production which were only integrated as parts of the whole social organism through exchange - is constantly diminished, while on the other hand the technical division of labour within the combined enterprises continues to advance." 


Capítulo 22 – The export of capital and the struggle for economic territory

"The policy of finance capital has three objectives: (1) to establish the largest possible economic territory; (2) to close this territory to foreign competition by a wall of protective tariffs, and consequently (3) to reserve it as an area of exploitation for the national monopolistic combinations. Such aims, however, were bound to come into the sharpest possible conflict with the economic policy which industrial capital carried to a state of classic perfection during its period of absolute rule (in the double sense that commercial and bank capital were subordinated to it, and that it had absolute control of the world market) in England.

(…)

In so far as the protective tariff has adverse effects on the rate of profit, the cartel seeks to overcome them by means which the tariff system itself provides. In the first place the development of export subsidies, which have been called into existence by tariff protection, enables the cartel to surmount, at least in part, the tariff barriers of other countries and thus, to some extent, avoid any reduction of output. And this will be all the easier the larger the volume of domestic output, subsidized by its own protective tariffs. This again does not promote an interest in free trade, but rather in the expansion of its own economic territory and in raising tariff rates. Should these means prove ineffective, however, the alternative is to export capital in the form of factories built abroad. A branch of industry which is menaced by the protective tariffs of foreign countries now makes use of these tariffs for its own purposes by transferring part of its production abroad. If this prevents the expansion of the parent concern and excludes the possibility of increasing the rate of profit by reducing costs of production, it is compensated by the increased profit which the same owners of capital receive from the increase in the price of the goods which they now produce abroad. Thus the export of capital, which receives a powerful stimulus from the protective tariff at home in one way, is also promoted by the protective tariff of other countries, and contributes to the penetration of capital into all parts of the world and the internationalization of capital.

In this way the effect of the falling rate of profit, brought about by the restriction of productivity as a result of the modern protective tariff, is cancelled out. From the standpoint of capital free trade thus appears superfluous and harmful; and it seeks to overcome the restriction of productivity resulting from the contraction of the economic territory, not by conversion to free trade, but by expanding its own economic territory and promoting the export of capital.

(…)

We know, moreover, that the opening of new markets is an important factor in bringing an industrial depression to an end, in prolonging a period of prosperity, and in moderating the effects of crises. The export of capital accelerates the opening up of foreign countries and promotes the maximum development of their productive forces. At the same time it increases domestic production, which has to supply the commodities that are exported abroad as capital. Thus it becomes a very powerful impetus to capitalist production, which enters upon a new period of Sturm und Drang (storm and stress) as the export of capital becomes general, during which it seems to be the case that the cycle of prosperity and depression has been shortened and crises have become less severe. The rapid increase in production also brings about an increased demand for labour power which is advantageous to the trade unions, and the tendencies towards pauperization inherent in capitalism appear to be overcome in the advanced capitalist countries. The rapid rise in production inhibits a conscious awareness of the ills of capitalist society and generates an optimistic view of its viability.

(…)

The old social relations are completely revolutionized, the age-old bondage to the soil of the 'nations without a history' is disrupted and they are swept into the capitalist maelstrom. Capitalism itself gradually provides the subjected people with the ways and means for their own liberation. They adopt as their own the ideal that was once the highest aspiration of the European nations; namely, the formation of a unified national state as an instrument of economic and cultural freedom. This independence movement threatens European capital precisely in its most valuable and promising areas of exploitation, and to an increasing extent it can only maintain its domination by continually expanding its means of coercion.

(…)

This explains why all capitalists with interests in foreign countries call for a strong state whose authority will protect their interests even in the most remote corners of the globe, and for showing the national flag everywhere so that the flag of trade can also be planted everywhere. Export capital feels most comfortable, however, when its own state is in complete control of the new territory, for capital exports from other countries are then excluded, it enjoys a privileged position, and its profits are more or less guaranteed by the state. Thus the export of capital also encourages an imperialist policy.

The export of capital, especially since it has assumed the form of industrial and finance capital, has enormously accelerated the overthrow of all the old social relations, and the involvement of the whole world in capitalism. Capitalist development did not take place independently in each individual country, but instead capitalist relations of production and exploitation were imported along with capital from abroad, and indeed imported at the level already attained in the most advanced country. Just as a newly established industry today does not develop from handicraft beginnings and techniques into a modern giant concern, but is established from the outset as an advanced capitalist enterprise, so capitalism is now imported into a new country in its most advanced form and exerts its revolutionary effects far more strongly and in a much shorter time than was the case, for instance, in the capitalist development of Holland and England.

(…)

This ideology [a do capitalismo financeiro], however, is completely opposed to that of liberalism. Finance capital does not want freedom, but domination; it has no regard for the independence of the individual capitalist, but demands his allegiance. It detests the anarchy of competition and wants organization, though of course only in order to resume competition on a still higher level. But in order to achieve these ends, and to maintain and enhance its predominant position, it needs the state which can guarantee its domestic market through a protective tariff policy and facilitate the conquest of foreign markets. It needs a politically powerful state which does not have to take account of the conflicting interests of other states in its commercial policy.It needs also a strong state which will ensure respect for the interests of finance capital abroad, and use its political power to extort advantageous supply contracts and trade agreements from smaller states ; a state which can intervene in every corner of the globe and transform the whole world into a sphere of investment for its own finance capital. Finally, finance capital needs a state which is strong enough to pursue an expansionist policy and the annexation of new colonies. Liberalism opposed international power politics, and only wanted to secure its own rule against the old forces of aristocracy and bureaucracy by granting them the least possible access to state power, but finance capital demands unlimited power politics, and this would be the case even if military and naval expenditures did not directly assure the most powerful capitalist groups of important markets, which provide in most cases monopolistic profits.

The demand for an expansionist policy revolutionizes the whole world view of the bourgeoisie, which ceases to be peace-loving and humanitarian. The old free traders believed in free trade not only as the best economic policy but also as the beginning of an era of peace. Finance capital abandoned this belief long ago. It has no faith in the harmony of capitalist interests, and knows well that competition is becoming increasingly a political power struggle. The ideal of peace has lost its lustre, and in place of the idea of humanity there emerges a glorification of the greatness and power of the state. The modern state arose as a realization of the aspiration of nations for unity. The national idea, which found a natural limit in the constitution of a state based upon the nation, because it recognized the right of all nations to independent existence as states, and hence regarded the frontiers of the state as being determined by the natural boundaries of the nation, is now transformed into the notion of elevating one's own nation above all others. The ideal now is to secure for one's own nation the domination of the world, an aspiration which is as unbounded as the capitalist lust for profit from which it springs. Capital becomes the conqueror of the world, and with every new country that it conquers there are new frontiers to be crossed. These efforts become an economic necessity, because every failure to advance reduces the profit and the competitiveness of finance capital, and may finally turn the smaller economic territory into a mere tributary of a larger one. They have an economic basis, but are then justified ideologically by an extraordinary perversion of the national idea, which no longer recognizes the right of every nation to political self-determination and independence, and ceases to express, with regard to nations, the democratic creed of the equality of all members of the human race. Instead the economic privileges of monopoly are mirrored in the privileged position claimed for one's own nation, which is represented as a 'chosen nation'. Since the subjection of foreign nations takes place by force - that is, in a perfectly natural way - it appears to the ruling nation that this domination is due to some special natural qualities, in short to its racial characteristics. Thus there emerges in racist ideology, cloaked in the garb of natural science, a justification for finance capital's lust for power, which is thus shown to have the specificity and necessity of a natural phenomenon. An oligarchic ideal of domination has replaced the democratic ideal of equality."

(Rudolf Hilferding, Finance Capital)


4. Fragmentos de  O Imperialismo e a Economia Mundial, de Bukharin


“Todas as partes deste sistema, organizadas numa grande proporção (cartéis, bancos, empresas do Estado), entram num processo incessante de integração. O processo se acentua na mesma medida do desenvolvimento da concentração capitalista. A ‘cartelização’ e a formação de empresas combinadas criam de imediato uma comunidade de interesses entre os bancos, que os financiam. De outra parte, todo acordo dos bancos facilita a aglomeração dos grupos industriais. As empresas do Estado se tornam cada vez mais dependentes dos grandes agrupamentos industriais e financeiros e vice-versa. Assim, as diferentes esferas do processo de concentração e de organização se estimulam reciprocamente e criam uma tendência muito forte à transformação de toda a economia nacional numa gigantesca empresa combinada sob a égide dos magnatas da finança e do Estado capitalista, de uma economia que monopoliza o mercado mundial e que se torna a condição necessária da produção organizada em sua forma superior não-capitalista.

O capitalismo mundial, o sistema de produção mundial, adquiriu, por consequência, no curso dos últimos anos, o seguinte aspecto: alguns corpos econômicos organizados e coerentes (grandes potências civilizadas) e uma periferia de países retardatários que vivem sob um regime agrário ou semi-agrário. O processo de organização (que, diga-se de passagem, não constitui, em absoluto, o fim ou o motivo impulsionador dos senhores capitalistas, como o afirmam seus ideólogos, porém unicamente o resultado objetivo de suas aspirações a um lucro máximo) tende a sair do quadro nacional. Aqui aparecem, contudo, dificuldades muito mais sérias. Primeiramente, é bem mais fácil vencer a concorrência sobre o terreno nacional que sobre o terreno mundial (os acordos internacionais se formam geralmente sobre a base de monopólios nacionais já construídos). Em segundo lugar, a diferença de estrutura econômica e, por conseguinte, dos custos de produção torna os acordos onerosos para os grupos nacionais avançados. Em terceiro lugar, a aglomeração com o Estado, dentro de suas fronteiras, constitui um monopólio sempre crescente, que garante lucros suplementares.

(...)

A sociedade capitalista é inconcebível sem armamentos, tanto como é inconcebível sem guerras. Assim como não são os preços baixos que engendram a concorrência, porém, ao contrário, a concorrência é que engendra o aviltamento dos preços, tampouco é a existência do exército que é a causa essencial e a força motriz das guerras (conquanto, sem dúvida, as guerras sejam impossíveis sem exércitos). Ao inverso, a inelutabilidade dos conflitos econômicos é que condiciona a existência dos exércitos. Daí porque, em nossos dias, quando os conflitos econômicos alcançam o mais alto grau de tensão, assistimos à corrida armamentista. A dominação do capital financeiro supõe o imperialismo e o militarismo. Neste sentido, o militarismo é um fenômeno histórico tão típico quanto o capital financeiro.

À medida que cresce de importância, o poder governamental modifica sua estrutura interna. Torna-se, mais do que nunca, o ‘comitê executivo das classes dominantes’. É verdade que ele sempre refletiu os interesses das ‘camadas superiores’. Porém, na medida em que estas camadas superiores constituíam uma massa mais ou menos amorfa, o poder organizado se equilibrava com a classe ou as classes não-organizadas, das quais encarnava os interesses. Hoje, a situação se modifica radicalmente. Doravante, o aparelho governamental encarna não só os interesses das classes dominantes, mas também sua vontade coletivamente organizada. Ele se equilibra não mais com os membros esparsos das classes dominantes, porém com suas organizações. Assim, o governo vem a ser de facto um ‘comitê’ eleito pelos representantes das organizações patronais, bem como o diretor supremo do truste capitalista nacional.

Nisto reside uma das principais causas da crise do parlamentarismo. Faz pouco tempo, o Parlamento era a arena em que se desenrolava a luta das frações dos grupos dominantes (burguesia, proprietários de terras, camadas burguesas diversas etc.). O capital financeiro fundiu a quase totalidade de seus matizes numa ‘massa reacionária única’, agrupada numa multiplicidade de organizações centralizadas. Ao mesmo tempo, as tendências ‘democráticas’ e liberais cedem o lugar à tendência monarquista claramente expressa do imperialismo moderno, que tem maior necessidade da ditadura do Estado. De certo modo, o Parlamento não é mais, hoje, senão um cenário onde se aplicam as decisões previamente elaboradas nas organizações patronais e onde a vontade coletiva do conjunto da burguesia organizada obtém unicamente sua consagração formal. Um ‘poder forte’, apoiado numa frota e num exército gigantescos, constitui o ideal burguês moderno. Não se trata, em absoluto, de ‘sobrevivências capitalistas’, como alguns supõem. Não se trata de vestígios do passado, testemunhos fortuitos do velho mundo. É uma formação social e política inteiramente nova, engendrada pelo desenvolvimento do capital financeiro. Se a velha política guerreira de ‘ferro e fogo’ serviu de modelo para a forma, isto ocorreu somente na medida em que as molas impulsionadoras da vida econômica moderna empurram o capital pelo caminho de uma política agressiva e da militarização do conjunto da ‘vida social’. A melhor prova não está somente na política exterior de países democráticos como a Inglaterra, França, Bélgica (veja-se a política colonial da Bélgica) e os Estados Unidos, mas outrossim nas mudanças ocorridas em sua política interior (militarização e desenvolvimento monarquista na França, ataques reiterados contra a liberdade das organizações operárias em todos estes países e assim por diante).

Sendo ele próprio o principal acionista do truste capitalista nacional, o Estado moderno é sua mais alta instância organizada em escala universal. Daí a sua potência formidável, quase monstruosa.”

(Bukharin: Economia, coleção “Grandes Cientistas Sociais”, organização de Jacob Gorender, pp.99-100; 103-194)





5. Outra versão da crítica de Lenin a Kautsky

“Se o nome de ultra-imperialismo é dado a uma unificação internacional de imperialismo nacional (ou mais corretamente, estatais) que seria capaz de eliminar os conflitos mais aterradores, mais perturbadores e mais desagradáveis como as guerras, as convulsões políticas, etc,. das quais os pequeno-burgueses tem tanto medo, então porque não se desviar da época presente de imperialismo que já chegou – a época que está nos olhando de frente, que está cheia de todo tipo de conflitos e catástrofes? Por que não se desviar para os sonhos inocentes de um ultra-imperialismo comparativamente pacífico, comparativamente não-conflituoso, comparativamente não-catastrófico?

Nesta tendência para se evadir do imperialismo que está aqui e passar em sonhos para uma época de ‘ultra-imperialismo’, da qual não sabemos nem se é realizável, não há nem um grão sequer de marxismo.

Havia um tempo em que Kautsky prometia ser um marxista na época catastrófica e turbulenta que estava por vir, época que ele foi levado a prever e reconhecer de maneira definitiva quando estava escrevendo seu trabalho de 1909 sobre a guerra vindoura. No entanto, agora que se tornou absolutamente claro que essa época chegou, Kautsky novamente promete ser um marxista na época do ultra-imperialismo que está por vir, da qual ele não sabe sequer se virá! (...) Para amanhã, temos um marxismo a crédito, um marxismo como promessa, um marxismo adiado. Para hoje, temos uma teoria oportunista pequeno-burguesa – e não somente uma teoria – para abrandar as contradições.

Pode-se, contudo, negar abstratamente que uma nova fase do capitalismo em seguida ao imperialismo, a saber, uma fase de ultra-imperialismo, é ‘pensável’? Não. De modo abstrato, pode-se pensar em tal fase. Na prática, porém, quem nega as tarefas duras de hoje em nome de sonhos a respeito das tarefas suaves do futuro se torna um oportunista. (...) Teoricamente não há dúvida de que o desenvolvimento caminha na direção de um único trust mundial que engolirá todas as empresas e todos os Estados sem exceção. Mas o desenvolvimento nessa direção está ocorrendo com tal desgaste, com tal ritmo, com tais contradições, conflitos e convulsões – não somente econômicas, mas também políticas, nacionais, etc. etc. – que antes que um trust mundial único seja formado, antes que os respectivos capitais financeiros nacionais formem uma a união mundial do ‘ultra-imperialismo’, o imperialismo explodirá inevitavelmente, o capitalismo se tornará o seu oposto.”





6. O imperialismo e a questão da autodeterminação nacional nos escritos posteriores de Lenin

 “La distinction que Lénine faisait à partir de 1912 à propos de la question nationale, et sur laquelle il ne cessera plus de mettre l'accent, entre nations opprimées (colonisées ou minoritaires) et Etats oppresseurs hégémoniques, est intégrée à sa compréhension de l'impérialisme; elle est constitutive de l'impérialisme; il écrit ainsi :  ‘La division des nations en nations oppressives et nations opprimées... constitue l'essence de l'impérialisme... elle est capitale sous l'angle de la lutte révolutionnaire contre l'impérialisme’. C'est cette conception qui préside à la définition des tâches de l'Internationale communiste sur la question nationale ct coloniale à son  Congrès en 1920.”

(Dictionnaire critique du marxisme, verbete “Imperialisme”, de René Galissot)



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Ein Marxist hat nicht das Recht, Pessimist zu sein


Ernst Bloch



Из искры возгорится пламя







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