domingo, 3 de abril de 2016

A claraboia e o holofote 30 (II)





Uma leitura do Manifesto do Partido Comunista





 Lenin


O Estado e a Revolução



  
1. As divergências de interpretação



George Lichtheim

O Estado e a Revolução constitui uma de suas piores obras escritas e também uma das menos importantes, no sentido de que não contém uma só ideia realmente operativa, mas apenas uma abundância de sofismas destinados a justificar a ruptura fundamental com a ortodoxia marxista (ver em particular as páginas onde, mediante um passe de mágica, ele se desembaraça da distinção entre democracia e ditadura). 

Poucas interpretações errôneas da natureza histórica são mais patéticas do que a concepção de Lenin sobre uma sociedade sem classes e sem Estado, tal como apontava em O Estado e a Revolução, no instante mesmo que a revolução que ele liderava estava a ponto de dar à luz o primeiro sistema totalitário da história moderna.

El Marxismo: um estudio histórico y crítico [1964}, Editorial Anagrama, Barcelona s/d, pp. 393 e 400



Leszek Kolakowski

Ameaçado de prisão, Lenin fugiu de Petrogrado e escondeu-se na Finlândia, dirigindo a atividade do partido e, ao mesmo tempo, escrevendo O Estado e a Revolução – um extraordinário projeto semi-anarquista para um estado proletário em que o poder seria exercido diretamente pela totalidade do povo em armas. As ideias básicas deste programa logo foram não apenas desmentidas no decorrer da revolução bolchevique, mas ridicularizadas pelo próprio Lenin como fantasias anarco-sindicalistas.

Main currents of marxism [1976-1978], volume II, Clarendon Press, Oxford, 1978 p. 475




Robert Service

Por que Lenin foi acusado de ter sido enormemente insincero no que diz respeito a este livro? A principal razão está no contraste entre as predições feitas em O Estado e a Revolução e a realidade do bolchevismo no poder. O Estado e a Revolução descreve um futuro iminente em que a classe trabalhadora se tornaria a classe dirigente e os trabalhadores comuns tomariam por si mesmos as decisões cruciais do Estado e da sociedade. As coisas tomaram um rumo bem diferente depois de outubro de 1917, quando o Estado soviético rapidamente se tornou uma ditadura de partido único que usava a força contra as greves industriais e os protestos políticos dos trabalhadores. Uma longa sombra de dúvida foi lançada sobre as intenções de Lenin quando escreveu O Estado e a Revolução.

Lenin: a biography [2000], Harvard University Press, Cambridge, Massachusetts, 2000, p. 293





Tamás Krausz

Duas tendências principais podem ser observadas nas análises mais importantes. Uma abordagem entende que se trata de uma obra intrinsecamente coerente e teoricamente consistente (por exemplo, Neil Harding, Kevin Anderson), baseada em ideais e princípios libertários. A outra abordagem leva em conta as circunstâncias históricas e as consequências da revolução, relatando-as como se O Estado e a Revolução tivesse sido a inspiração intelectual e a expressão de uma virada e de um desdobramento autoritários (por exemplo, A.J. Polan, Robert Service).

De todas as obras de Lenin, O Estado e a Revolução é a que teve a posteridade mais interessante. A ala marxista, e de fato a maioria dos movimentos anticapitalistas e críticos ao sistema, apropriaram-se dela. O texto pode ser aplicado seja contra a conceptualização stalinista do Estado, seja contra a capitalista, uma vez que o objetivo final marxista de dissolução do Estado era (e é) afirmado como objetivo da Revolução Russa e da revolução socialista universal.

Reconstructing Lenin: an intellectual biography [2008], Monthly Review Press, New York, 2015  (ebook),  p. 192








Ein Marxist hat nicht das Recht, Pessimist zu sein.  



вся власть Советам!












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