Em Tomar, quando a névoa se vai
Uma manhã de nevoeiro
Lisboa amanheceu no nevoeiro. Do parque Eduardo VII não se via o Tejo e mal se enxergava o Castelo de São Jorge. Mas era um mau dia para a volta de D. Sebastião. Notícias de adesão à greve geral eram divulgadas pela RTP. O Metropolitano só voltaria a funcionar a partir das 11 horas, como pudemos verificar pela multidão ansiosa à qual nos juntamos à entrada da estação Marquês de Pombal. A custo, e ainda indecisos, chegamos à estação Santa Apolônia, onde tomaríamos o comboio rumo a Tomar. Já o dia se abria quando embarcamos. Santarém repousava gloriosa ao sol. Não demorou para que Ludmila e eu galgássemos o outeiro do castelo de Tomar, cuja aparência conhecia apenas por um documentário um tanto sensacionalista que o Discovery Channel fizera sobre os Templários.
Ao percorrermos o claustro da lavagem e o do cemitério a caminho da nossa esperada visita à Charola, ocorreu-me que os impérios universais, como o de Carlos V e o de Filipe de Espanha, que foi aqui levantado rei de Portugal, embaraçam as linhas das nações, mas não abolem, antes reforçam, pela lei da reação, o sentimento de pertencimento à terra. Os impérios são grandes fautores dos nacionalismos.
É isso que desperta em Portugal e noutros países submetidos ao imperialismo da Troika um sentimento de impotência que só encontra escape na derrisão cínica ou na afirmação da nacionalidade contra o cosmopolitismo dos ricos da União Europeia.
No entanto, eu, mestiço num povo de mestiços que foram sempre súditos de todas as Metrópoles econômicas e culturais, também sei que os impérios, ao enredarem as linhas das nações, misturam o cá e o lá das maneiras mais inesperadas. É verdade que produzem reações nacionalistas violentas, que custam a ser reprimidas, mas também ensinam o que é pertencer a muitos lugares, o que é ser habitante de si mesmo e cidadão do universo.
É por isso que agora Tomar é meu cá, tanto quanto Paris, Verona ou Bruxelas, ou tanto quanto o humilde bairro sem fama nem nomeada da maior cidade do Brasil, que me viu crescer e aprender a ler todos os nomes no Atlas.
claustro de D. João III |
1314-2014
A história começa em França.
Diante dos inquisidores leais a Felipe o Belo, os templários foram acusados de enriquecimento ilícito, sodomia, obscenidade, recusa dos sacramentos, idolatria, renegação de Cristo. Uma bula do papa Clemente V suprimiu a ordem dos Cavaleiros do Templo.
Diante dos inquisidores leais a Felipe o Belo, os templários foram acusados de enriquecimento ilícito, sodomia, obscenidade, recusa dos sacramentos, idolatria, renegação de Cristo. Uma bula do papa Clemente V suprimiu a ordem dos Cavaleiros do Templo.
Os templários nunca chegaram a ser condenados pela Inquisição, mas o rei exigiu que Jacques de Molay, grão-mestre da ordem, e seus companheiros fossem queimados na ponta da Île de la Cité, diante dos jardins do palácio real, no dia 18 de março de 1314.
Nos sete séculos que se passaram, o nome dos templários foi metido no saco de maldades ao qual se lançariam também o dos jesuítas, maçons e sábios do Sião. Sinal certo e claro de que esteve muito ocupada a andar pelo mundo a senhora Difamação, cujas sete bocas falam com fluência todas as línguas dos homens e que nunca se separa de suas irmãs aleijadas e impertérritas: Ignorância, vestida de remendos, e Suspeição, sempre embuçada.
Paris: ponta da Île de la Cité |
D. Dinis
Com a dissolução da ordem do Templo, seus bens foram colocados sob sequestro e passaram aos cuidados de administradores eclesiásticos. No reino de Portugal, para evitar que fossem confiscados pela Igreja, D. Dinis os apreendeu e incorporou ao domínio real até que a situação se deslindou em 1319, quando uma bula papal autorizou a criação da Ordem de Cristo, à qual D. Dinis entregou os bens dos templários portugueses, entre eles o Castelo de Tomar.
A fortificação fora construída em 1160 por Gualdim Pais, mestre dos templários portugueses, incumbido por Afonso Henriques de defender a região das investidas dos mouros, recentemente expulsos de Santarém e Lisboa. É bem possível que se tenha iniciado na mesma época a edificação da charola, a igreja "redonda" que é marca da ordem, inspirada nas antigas plantas octogonais do mundo romano tardio das quais são exemplos a Basílica do Santo Sepulcro ou San Vitale de Ravena, que havia servido de modelo para a Capela Palatina de Carlos Magno.
D. Henrique
A fortificação fora construída em 1160 por Gualdim Pais, mestre dos templários portugueses, incumbido por Afonso Henriques de defender a região das investidas dos mouros, recentemente expulsos de Santarém e Lisboa. É bem possível que se tenha iniciado na mesma época a edificação da charola, a igreja "redonda" que é marca da ordem, inspirada nas antigas plantas octogonais do mundo romano tardio das quais são exemplos a Basílica do Santo Sepulcro ou San Vitale de Ravena, que havia servido de modelo para a Capela Palatina de Carlos Magno.
A charola dos templários |
a alcáçova do castelo de Tomar |
Porta do Sol, junto à alcáçova |
D. Henrique
D. João I obteve permissão papal para colocar seus três filhos à frente de cada uma das ordens militares portuguesas: a de Santiago, a de Cristo e a de Avis. Coube ao infante D. Henrique administrar a Ordem de Cristo em 1418. O papa atribuiu à Ordem lutar contra os mouros e expandir a fé cristã na África.
D. Henrique não esquentou lugar em Tomar, que se tornara sede da Ordem de Cristo em 1357. O Infante se estabeleceu entre Sagres e o Cabo de São Vicente e orientou suas atividades para a exploração marítima. Logo depois de elevado a governador da ordem de Cristo, ele patrocinou a conquista da Ilha da Madeira e, um pouco mais tarde, dos Açores.
Do ano de 1434 em que Gil Eanes dobrou o Cabo do Bojador até 1447, ano seguinte à chegada de Dinis Dias às costas do Senegal, um terço das expedições africanas foram enviadas por iniciativa exclusiva de D. Henrique. Como se ainda fosse pouco, à fama do Infante foram acrescentados outros êxitos marítimos da Ordem de Cristo, da qual foram cavaleiros vários dos navegantes ilustres que dilataram a fé e o império, entre os quais Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral.
O Infante D.Henrique quase nunca saiu ao mar, mas a posteridade, vezeira em levar a sérios seus próprios gracejos, deu o nome de "Navegador" a este príncipe riquíssimo que navegava apenas nos portulanos e enfrentava a ira do mar Oceano com ambos os pés plantados na boa e firme terra do Algarve.
D. Henrique não esquentou lugar em Tomar, que se tornara sede da Ordem de Cristo em 1357. O Infante se estabeleceu entre Sagres e o Cabo de São Vicente e orientou suas atividades para a exploração marítima. Logo depois de elevado a governador da ordem de Cristo, ele patrocinou a conquista da Ilha da Madeira e, um pouco mais tarde, dos Açores.
Do ano de 1434 em que Gil Eanes dobrou o Cabo do Bojador até 1447, ano seguinte à chegada de Dinis Dias às costas do Senegal, um terço das expedições africanas foram enviadas por iniciativa exclusiva de D. Henrique. Como se ainda fosse pouco, à fama do Infante foram acrescentados outros êxitos marítimos da Ordem de Cristo, da qual foram cavaleiros vários dos navegantes ilustres que dilataram a fé e o império, entre os quais Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral.
O Infante D.Henrique quase nunca saiu ao mar, mas a posteridade, vezeira em levar a sérios seus próprios gracejos, deu o nome de "Navegador" a este príncipe riquíssimo que navegava apenas nos portulanos e enfrentava a ira do mar Oceano com ambos os pés plantados na boa e firme terra do Algarve.
entrada da charola de Tomar, decorada no reinado de D. Manuel I |
o tambor octogonal no centro da charola |
o exterior do tambor central da charola |
D. Sebastião
O Desejado foi menino solitário num palácio triste e austero, governado pela saias devotas da avó Catarina, regente, e pelas púrpuras cardinalícias do tremebundo tio-avô Henrique. O paço real era uma grande sacristia dirigida pelos padres Luís da Câmara e Amador Rebelo, preceptores da Companhia de Jesus. Pelos cantos, nobres espadas enferrujadas contavam façanhas das antigas jornadas d'África, que o principezito ouvia com o mesmo prazer espantado com que seguia a relação da batalha milagrosa de Ourique ou as aventuras não menos estapafúrdias dos cavaleiros do rei Sagramor, que Jorge Ferreira de Vasconcelos lhe dedicara em 1567.
A ninguém parecerá estranho, portanto, que o último monarca da dinastia de Avis, do mesmo sangue do Infante Santo D. Fernando, que morreu prisioneiro em Fez; herdeiro de D. Manuel, rei venturoso e governador da Ordem de Cristo; neto de Carlos V, imperador do Sacro Império e rebento dos reis católicos de Castela e Aragão; a ninguém parecerá estranho que o Desejado se tenha feito cruzado.
Foi duas vezes a África. Na última, desembarcou no Marrocos para apoiar o xarife Moulay Mohamed, que disputava com seu tio Moulay Malik o domínio de Fez. Na batalha de Alcácer Quibir, os três monarcas morreram. Aquele dia 4 de agosto de 1578 encerrou a última cruzada do mundo mediterrâneo.
O rei português desapareceu no areal. Voltará, quem sabe, num dia de nevoeiro.
O Desejado se tornou O Encoberto.
António Sérgio e Oliveira Martins
Leitor de Spinoza, António Sérgio não era paciente com a besteira nem caridoso com os mitos. Do seu exílio espanhol, disposto a conter a maré montante neo-sebastianista, resolveu aquilatar o real valor do rei de carne e osso que sumiu no areal. Com uma fúria que desmente os que o acoimam racionalista, Sérgio exprobou, acérrimo, o último monarca de Avis:
"Não é propriamente a imprudência o que deploramos em D. Sebastião, mas a estupidez, o desvairamento, a tontaria, a explosividade mórbida, a ferocidade inútil, a pataratice constante desse impulsivo degenerado, que era de todo destituído das qualidades de comando absolutamente indispensáveis para a execução do que ambicionava. Se um acaso, por exemplo, lhe desse a vitória em Alcácer Quibir, logo outras asneiras o haveriam perdido, porque o dom da asneira em jacto era nesse jovem uma propriedade congénita." (1)
No entanto, já na geração anterior, Oliveira Martins percebera que o sebastianismo pouco tinha a ver com o rei desaparecido. O mito sebástico teria raízes na cultura celta dos antigos lusitanos. D. Sebastião era o avatar de outro rei que voltaria das brumas: Artur. Esse suposto legado celta, moldado pelo messianismo judaico-cristão, ressurgia nos tempos de crise na forma de um esperado herói providencial.
"O sebastianismo era pois uma explosão simples da desesperança, uma manifestação do gênio natural íntimo da raça, e uma abdicação da história. Portugal renegava, por um mito, a realidade; morria para a história, desfeito num sonho; envolvia-se, para entrar no sepulcro, na mortalha de uma esperança messiânica." (2)
Com a desaparição do rei sem sucessor, crise derradeira de uma estirpe que começara numa crise, o que restava aos portugueses era o sebastianismo, "prova póstuma da nacionalidade" (3).
Talvez hoje seja mais fácil ter complacência com o mito sebástico do que gastar o verbo em objurgatórias contra um rei morto. Porém os mitos aderem a qualquer suporte em que possam medrar. E medram demasiado depressa, se não se lhes dá uma forte vassourada de quando em quando. Por isso, António Sérgio não exorbitou e certamente daria uns vigorosos golpes de vassoura nas confrarias que saudaram, em plena crise da zona do euro, o retorno à pátria do elmo que o Desejado levou para Alcácer Quibir.
Privilégio dos reis é o serem inimputáveis, como o são os asnos que invadem hortas, razão pela qual não têm que se defender, mas, diante da cara feia que lhe fazem os historiadores, pode ser que o Desejado, seguindo o exemplo do narrador das Proezas da Segunda Távola Redonda e antecipando-se a um fidalgo manchego, de lanza en astillero y rocin flaco, nos fizesse mercê de um simples alvitre a propósito do despropósito de seus atos:
"Muitas culpas houve no mundo de homens graves que, dado que não se louvem nem devam seguir, muitas vezes tirou delas a suma providência por sua bondade louvado fruto; não ficam por isso os autores delas desculpados, mas é louvada a divina habilidade que de males frutifica bens. Donde se culpamos dom Lucidardos por seguir seu Amor vão, louvemos o autor do bem, que de seus trabalhos culpados tira tão heroicas e louvadas obras para exemplo da animosa cavalaria (...)" (4)
"Não é propriamente a imprudência o que deploramos em D. Sebastião, mas a estupidez, o desvairamento, a tontaria, a explosividade mórbida, a ferocidade inútil, a pataratice constante desse impulsivo degenerado, que era de todo destituído das qualidades de comando absolutamente indispensáveis para a execução do que ambicionava. Se um acaso, por exemplo, lhe desse a vitória em Alcácer Quibir, logo outras asneiras o haveriam perdido, porque o dom da asneira em jacto era nesse jovem uma propriedade congénita." (1)
No entanto, já na geração anterior, Oliveira Martins percebera que o sebastianismo pouco tinha a ver com o rei desaparecido. O mito sebástico teria raízes na cultura celta dos antigos lusitanos. D. Sebastião era o avatar de outro rei que voltaria das brumas: Artur. Esse suposto legado celta, moldado pelo messianismo judaico-cristão, ressurgia nos tempos de crise na forma de um esperado herói providencial.
"O sebastianismo era pois uma explosão simples da desesperança, uma manifestação do gênio natural íntimo da raça, e uma abdicação da história. Portugal renegava, por um mito, a realidade; morria para a história, desfeito num sonho; envolvia-se, para entrar no sepulcro, na mortalha de uma esperança messiânica." (2)
Com a desaparição do rei sem sucessor, crise derradeira de uma estirpe que começara numa crise, o que restava aos portugueses era o sebastianismo, "prova póstuma da nacionalidade" (3).
Talvez hoje seja mais fácil ter complacência com o mito sebástico do que gastar o verbo em objurgatórias contra um rei morto. Porém os mitos aderem a qualquer suporte em que possam medrar. E medram demasiado depressa, se não se lhes dá uma forte vassourada de quando em quando. Por isso, António Sérgio não exorbitou e certamente daria uns vigorosos golpes de vassoura nas confrarias que saudaram, em plena crise da zona do euro, o retorno à pátria do elmo que o Desejado levou para Alcácer Quibir.
Privilégio dos reis é o serem inimputáveis, como o são os asnos que invadem hortas, razão pela qual não têm que se defender, mas, diante da cara feia que lhe fazem os historiadores, pode ser que o Desejado, seguindo o exemplo do narrador das Proezas da Segunda Távola Redonda e antecipando-se a um fidalgo manchego, de lanza en astillero y rocin flaco, nos fizesse mercê de um simples alvitre a propósito do despropósito de seus atos:
"Muitas culpas houve no mundo de homens graves que, dado que não se louvem nem devam seguir, muitas vezes tirou delas a suma providência por sua bondade louvado fruto; não ficam por isso os autores delas desculpados, mas é louvada a divina habilidade que de males frutifica bens. Donde se culpamos dom Lucidardos por seguir seu Amor vão, louvemos o autor do bem, que de seus trabalhos culpados tira tão heroicas e louvadas obras para exemplo da animosa cavalaria (...)" (4)
Mas será verdade que tudo vale a pena quando a alma não é pequena?
Filipe de Espanha
Com o desaparecimento de D. Sebastião, o velho cardeal D. Henrique assume o trono. Nas cortes de Almeirim, em janeiro de 1580, o cardeal morre sem haver nomeado um sucessor.
D. Antonio, prior do Crato, neto de D. Manuel e combatente de Alcácer Quibir, é proclamado rei em Santarém, Setúbal e Lisboa.
Filipe II, também pretendente ao trono, dispôs suas tropas em Badajoz, prontas para uma invasão. O Duque de Alba foi convocado para chefiar a operação. O prior do Crato, facilmente derrotado, se exilou na França de Henri IV.
A epidemia de gripe grassava por toda a península ao longo de 1580. Camões morreu em junho; a rainha Ana, esposa de Filipe, grávida, faleceu em outubro. Filipe nunca mais se casou. O luto retardou seus planos a respeito de Portugal. Somente em dezembro atravessou a fronteira e entrou em Elvas, donde enviou convocações para que as Corte de Portugal se reunissem em Tomar, para evitar a epidemia em Lisboa.
Filipe II foi solenemente levantado e jurado como Rei de Portugal nas Cortes de Tomar em 16 de abril de 1581, domingo.
"Para Espanha, a união ibérica significou antes de mais o cumprimento de um desígnio perfilhado, pelo menos, a partir de Isabel a Católica e que jamais deixou de ter adeptos: congregação política de todo o espaço ibérico debaixo do mesmo cetro, com o epicentro em Castela, bem significado na escolha de Madrid como capital equidistante. Como dirá Pierre Vilar, «em 1580 colocar-se-á o verdadeiro ponto culminante da história peninsular». a anexação de Portugal arrastou o seu vasto império espalhado pelos continentes asiático, africano e americano com as suas enormes riquezas potenciais ou reais.
E o ideal da Monarquia Universal tornou-se real, a Monarquia Universal finalmente chegou. de algum modo refez-se a unidade do mundo que o Tratado de Tordesilhas havia salomonicamente rompido." (5)
Em Tomar, os portugueses exigiram que Portugal fosse tratado como herança e não como conquista do rei Filipe. Essa demanda foi enunciada de maneira cristalina pelo "braço do povo" reunido num capítulo nas Cortes.
"Posto que vossa Majestade herdou estes reinos e senhorios de Portugal, nem por isso se uniram aos de Castela, mas os herdou e principalmente e de per si, pelo que lembramos e pedimos a Vossa Majestade que estes reinos fiquem sempre inteiros e sejam per si em tudo e por tudo se hajam de reger e governar por suas leis, ordenações, foros e costumes, como até agora se fez e usou." (6)
O Estatuto de Tomar reconheceu que Portugal não estava sujeito a Castela. Esse princípio claro de divisão do lá e cá será esquecido mais tarde pelo Conde Duque de Olivares, o todo-poderoso ministro de Filipe IV, braço forte de um rei pasmado.
Fernando Álvarez de Toledo y Pimentel
Gaspar de Guzmán, futuro Conde-Duque de Olivares, nem mesmo havia nascido quando das Cortes de Tomar. Seu tempo ainda está distante.
No entanto, outro grande do mundo partiu daqui mesmo, em Tomar, em dezembro de 1582. Fernando Álvarez de Toledo y Pimentel, o Duque de Alba, o estrategista militar de Carlos V e de Filipe II, o vencedor da batalha de Mühlberg contra os príncipes luteranos da Liga Esmalcáldica, o carrasco da independência dos Países Baixos, o invasor de Portugal.
Era um homem duríssimo. Quando Filipe quis investigar os excessos cometidos durante a invasão, o duque de Alba se recusou a colaborar. O rei desistiu, mas queixou-se de que "a arrogância do duque é igual à sua lealdade". (7)
De todas os crimes infames cometidos em nome do poder e da religião, poucos há tão abomináveis quanto as milhares de execuções ordenadas pelo Duque para conter a revolta dos Países Baixos contra o domínio intolerante da Espanha católica. A carnificina culminou na decapitação de Lamoraal, conde de Egmont na Grand-Place de Bruxelas em 1568.
Alba se tornou um nome odiado na Europa protestante, mas Egmont foi transformado em mártir da liberdade num drama de Goethe, que inspirou uma das mais belas aberturas de Beethoven, cujo maior desejo sempre foi o de compor a música da emancipação humana.
De tudo isso, resta que o temível Duque de Alba, cruel cá e lá, morreu às turras com seu rei, às margens do modesto rio Nabão, na pequena Tomar, numa terra em que era odiado.
Nem sequer me lembrei dele quando, entre as ameias do castelo dos Templários, naquela tarde de sol em que eu sonhava de olhos abertos com todos os nomes do Atlas, eu olhava para Tomar, cidade sem névoas.
Notas:
(1) António Sérgio, Breve Interpretação da História de Portugal, p. 104
(2) Oliveira Martins, História de Portugal, tomo II, p. 82
(3) idem, p. 79
(4) Jorge Ferreira de Vasconcelos, Memorial das Proezas da Segunda Távola Redonda, capítulo 43, p. 289
(5) Francisco Ribeiro da Silva, "Felipe II e Portugal" in Quinhentos/Oitocentos (Ensaios de História), p. 251
(6) citado em Rui Ramos (coordenador), História de Portugal, p. 277
(7) Henry Kamen, Filipe da Espanha, p. 260
(1) António Sérgio, Breve Interpretação da História de Portugal, p. 104
(2) Oliveira Martins, História de Portugal, tomo II, p. 82
(3) idem, p. 79
(4) Jorge Ferreira de Vasconcelos, Memorial das Proezas da Segunda Távola Redonda, capítulo 43, p. 289
(5) Francisco Ribeiro da Silva, "Felipe II e Portugal" in Quinhentos/Oitocentos (Ensaios de História), p. 251
(6) citado em Rui Ramos (coordenador), História de Portugal, p. 277
(7) Henry Kamen, Filipe da Espanha, p. 260
Alain Demurger, Os Cavaleiros de Cristo: Templários, Teutônicos, Hospitalários e outras ordens militares na Idade Média (sécs. XI-XVI), Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2002 | Encyclopaedia Britannica | Jacqueline Hermann, No reino do Desejado: a construção do sebastianismo em Portugal (séculos XVI e XVII), Companhia das Letras, São Paulo, 1998 | Henry Kamen, Filipe da Espanha, Record, Rio de Janeiro, 2003 | Jacques Le Goff (direção), Homens e Mulheres da Idade Média, Estação Liberdade, São Paulo, 2013 | Eduardo Lourenço, Mitologia da Saudade, Companhia das Letras, São Paulo, 1999 | J.P. Oliveira Martins, História de Portugal,
tomo II, Livraria Bertrand, Lisboa, 1882 | Rui Ramos (coordenador), HIstória de Portugal, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2010 | Antonio Sérgio, Breve Interpretação da História de Portugal, Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa, 1983 | Francisco Ribeiro da Silva, Quinhentos /
Oitocentos (Ensaios de História), Faculdade de Letras da Universidade do Porto,
Porto, 2008 | Jorge Ferreira de Vasconcelos, Memorial das Proezas da Segunda Távola Redonda, ao muito alto e muito poderoso rei Dom Sebastião, primeiro deste nome em Portugal, Nosso Senhor; Impressa pela primeira vez no ano de 1567, Typographia do Panorama, Lisboa, 1867
claustro da Hospedaria, à direita, o exterior do coro manuelino da igreja de Tomar |
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